Vivemos em uma cultura que cultua o planejamento. Planilhas, metodologias, metas trimestrais, a obsessão por mapear o futuro em detalhes minuciosos — tudo isso nos dá a ilusão sedutora de que temos o controle. Acreditamos que, ao desenhar a linha reta no mapa, a realidade terá a decência de segui-la. Mas a vida, e sobretudo o mercado, tem uma inteligência própria: a de ser intrinsecamente volátil, ambígua e, muitas vezes, brutalmente caótica.
O grande lance é que o plano, em sua essência, é estático. É a fotografia de um momento, uma construção lógica baseada em premissas que, no minuto seguinte ao seu fechamento, já podem ter sido alteradas por um algoritmo, uma crise geopolítica, um concorrente inesperado ou uma mudança silenciosa no comportamento do consumidor. O planejamento rígido, em vez de ser uma bússola, torna-se uma âncora que nos impede de manobrar. É uma forma de miopia contextual.
Como disse Bruce Lee, em uma metáfora que transcende as artes marciais para se tornar uma filosofia de vida e negócios: “Esvazie sua mente de modelos, formas, seja amorfo como a água. Você coloca a água em um copo, ela se torna o copo. Você coloca a água em uma garrafa, ela se torna a garrafa. Seja água, meu amigo.”
A realidade é um campo de jogo dinâmico, interligado e sistêmico. Não se constrói um legado em saltos curtos e inconstantes, mas em dias, semanas e meses de trabalho pouco glamuroso, mas essencial. O que separamos na teoria — a estratégia, a execução, o imprevisto — está, na prática, fundido. E a humildade de não saber, de reconhecer a interdependência dos fatores e a necessidade de ajustar a rota, prova-se ser mais valiosa do que a aderência cega a qualquer documento inicial.
Essa obsessão pelo controle máximo nos desconecta da vida, do aprendizado e da própria inovação. A inovação real não brota de um cronograma engessado, mas da capacidade de integrar o inesperado— de ouvir o sinal sutil que o projeto em si está emitindo, de reorientar a decisão com perguntas que questionam o que parecia certo e de atuar com flexibilidade mental quando o cenário exige. A inteligência da resiliência e do ajuste fino, que reside no meio do caminho, é o que separa o gesto romântico do ato de criação real.
Enquanto a IA avança aceleradamente, ela nos lembra que as capacidades de otimização e cálculo estão cada vez mais automatizadas. O que sobra e o que nunca foi dela é a visão crítica, o discernimento e a leitura de cenário. É a capacidade humana de interpretar, de conectar insights, de perceber o timing e, crucialmente, de sustentar a ambiguidade sem cair no pânico. O verdadeiro diferencial hoje não é a exatidão do seu plano, mas a velocidade e a consciência com que você o adapta.
No fim, o controle é uma miragem. Aquilo que realmente transforma é a presença com que habitamos a incerteza, a escuta com que acolhemos o desvio e a coragem de sustentar a complexidade mesmo quando o mercado cobra a simplicidade. Precisamos trocar a compulsão por controle por uma busca por sentido compartilhado.
Afinal, se você fosse obrigado a confiar menos na sua planilha e mais na sua capacidade de adaptação, o que você faria de diferente hoje?





